A escritora e museóloga Joana Flores, servidora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), irá reunir artistas baianos em mais um show beneficente para arrecadar doações para as vítimas da tragédia natural ocorrida em Moçambique, na África. O evento tem apoio do Centro de Artes, Humanidades e Letras (CAHL), campus da UFRB na cidade de Cachoeira e um dos postos de arrecadação de donativos da campanha #NósSomosMoçambique.
O show beneficente acontece no dia 16 de maio, no CAHL. Os ingressos podem ser trocados por 400g de leite em pó ou 4,5l de água mineral no local do evento, a partir das 16 horas. Entre as atrações confirmadas estão os músicos Moreira, Fábio Haendel, Rho Heitz, Mateus Filho, Rafique Nasser, Tonho Dionorina, Sued Nunes, MC Jayne, Pablues, Bruno Katita, Ramon Lima e participação do DJ Samir Suzart.
Essa é a segunda vez que a museóloga mobiliza seus contatos com músicos conhecidos para reforçar a campanha #NósSomosMoçambique. A iniciativa surgiu a partir de sua comoção em relação à situação dos moçambicanos atingidos pelo ciclone Idai no último dia 14 de março e, mais recentemente, dia 26 de abril, pelo ciclone ciclone Kenneth. "É também uma iniciativa que parte pelo incômodo que dá em mim, quando acontecem todas essas catástrofes. Eu venho de outros movimentos, não com essa proporção. Agora, vendo essa situação e a pouca mobilização da sociedade em si, eu me utilizei desse lugar de escritora para poder ir atrás das pessoas que eu conheci durante essa jornada", disse Joana, em entrevista ao G1 Bahia.
A primeira edição do evento ocorreu em Salvador, no dia 06 de abril, na Praça Teresa Batista, Pelourinho. Na ocasião, Joana reuniu um time de artistas composto por Dão Black, Lazzo, Dionorina, Aloísio Menezes, Wilson Carvalho, Rafique Nasser, Patiño, Duller, Marcelo Flores, Marcelo Pinho, Pablicio Pablues, João Tória, Wil Carvalho e Juliana Ribeiro. Como resultado, foram arrecadados mais de 270 kg de leite em pó. O lema foi “ Música + Atitude + Solidariedade”.
Desta vez, a aposta é no lema “Cinco Toneladas de Amor”, uma vez que é preciso arrecadar no mínimo cinco toneladas de donativos para que eles possam ser levados para o país africano, de acordo com informações do Corpo de Bombeiros. “A gente precisa de órgãos e instituições que abracem essa causa. De início não tínhamos idéia de como levar esses donativos até Moçambique, mas já temos o apoio do Corpo de Bombeiros Brigada K9 e da Polícia Militar do Estado da Bahia para concluir essa empreitada”, disse Joana.
As doações de alimentos não perecíveis, itens básicos de higiene pessoal e produtos de primeiros socorros podem ser feitas mesmo por quem não participar do show. Os interessados têm até o dia 30 de maio para fazer a sua doação no CAHL. Em Salvador também há postos de coleta no Museu Carlos Costa Pinto, Museu de Arte Sacra da UFBA, Centro Cultural Solar Ferrão, Museu Udo Knoff de Azulejaria e Cerâmica, Museu Tempostal e Clube de Mães do Conjunto Pirajá I.
Vínculo com a África - Para o diretor do CAHL, Jorge Cardoso Filho, a iniciativa de Joana em mobilizar a comunidade artística, cultural e intelectual do Recôncavo em um ato em prol dos moçambicanos só reforça os vínculos e a cooperação da UFRB com os países africanos. “Isso é ainda mais importante para o campus de Cachoeira, que abriga os cursos de artes e humanidades, dentre eles o Mestrado Profissional em História da África, da Diáspora e dos Povos Indígenas”, ressaltou.
“É mais uma ação cultural e política que desenvolvemos no sentido de trazer nossos alunos, com as suas formações, para esta vertente cidadã, engajada, crítica e de articulação com esse conhecimento pós-colonial e diaspórico, que a gente tanto debate e se materializa no nosso dia a dia”, diz Cardoso Filho. Uma dessas parcerias se dá por meio do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB) no âmbito do Programa Abdias do Nascimento, que oferece bolsas de graduação sanduíche para estudantes de História na Universidade Pedagógica, na cidade de Nampula.
A UFRB tem ainda acordos de cooperação acadêmica, científica e cultural vigentes com duas instituições moçambicanas: a Universidade Zambeze (UniZambeze), na cidade de Beira, e a Universidade Pedagógica, na cidade de Maputo. Ao todo, a UFRB já recebeu oito estudantes moçambicanos e encaminhou cinco para intercâmbio.
UFRB mobilizada - A situação atual de Moçambique também tem inspirado outras iniciativas na UFRB. Professores, técnicos administrativos e estudantes dos Programas de Pós-Graduação estão promovendo uma campanha para arrecadar doações em dinheiro para ajudar as vítimas.
A conta corrente CAMPANHA SOLIDÁRIA UFRB-MOÇAMBIQUE, Banco do Brasil, Agência 3832-6, Conta Corrente 37.251-X, estará disponível pelo período de seis meses (180 dias) para que a comunidade acadêmica e a comunidade externa contribuam com recursos que serão repassados mensalmente aos atingidos pelos ciclones, por meio da Fundação Fernando Leite Couto. Sediada em Maputo, a instituição cultural leva o nome do pai do escritor moçambicano Mia Couto, que é seu atual presidente.
“A ideia veio da própria necessidade de estarmos sempre mobilizados para ajudar o próximo e pelo fato de já termos recebido estudantes de Moçambique e termos professores que já estiveram no país e desenvolvem pesquisas com instituições locais. Temos, portanto, – e eu, em especial, por ter nascido em Moçambique - uma sensibilidade institucional para os estudos sobre países africanos, em várias áreas de conhecimento, e a compreensão do aprendizado mútuo nessa cooperação”, diz a professora Ana Fermino Soares, que hoje articula a campanha em solidariedade ao país natal, ao lado dos demais coordenadores de Pós-Graduação.
Consequências - “O ciclone Idai atingiu as províncias centrais de Moçambique. A zona mais radicalmente afetada foi a cidade da Beira, capital da Província de Sofala, a segunda mais populosa do país”, explica o professor Juvenal de Carvalho, especialista em História da África e que esteve no país entre julho de 2017 e junho de 2018 pelo projeto Arquivo Brasil-Moçambique. “Os moçambicanos estão acostumados a enfrentar eventos climáticos duros, mas este ciclone teve dimensão muito maior e, por isso, o impacto significativo em perdas de vidas e na infraestrutura. São mais de 600 vítimas fatais e mais de 1400 feridos, além dos desabrigados”, diz.
Já o ciclone Kenneth atingiu o território moçambicano com força superior à do ciclone Idai, deixando cerca de 18 mil pessoas refugiadas em abrigos de emergência. Carvalho explica que a resposta do governo moçambicano é coordenada pelo Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC) com apoio da Organização das Nações Unidas (ONU) e de outros países. “As ações de solidariedade promovidas pela UFRB se somam com essas iniciativas e com as que estão sendo desenvolvidas em todo o Brasil. São ações significativas para apoiar as vítimas na reconstrução de suas vidas reduzindo os efeitos desta calamidade”, avalia.